Ilustr.: Kate Rodriguez |
Ser sensível neste mundo requer muita coragem.
Este jeito de ouvir além dos olhos, de ver além dos ouvidos, de sentir a textura do sentimento alheio tão clara no próprio coração e tantas vezes até doer ou sorrir junto com toda sinceridade. Esta sensação, de vez em quando, de ser estrangeiro e não saber falar o idioma local, de ser meio ET, uma espécie de sobrevivente de uma civilização extinta. Esta intensidade toda em tempo de ternura minguada. Este amor tão vívido em terra em que a maioria parece se assustar mais com o afeto do que com a indelicadeza. Este cuidado espontâneo com os outros. Esta vontade tão pura de que ninguém sofra por nada. Este melindre de ferir por saber, com nitidez, como dói se sentir ferido.
Ser sensível neste mundo requer muita coragem. Muita. Todo dia.
Esta saudade, que às vezes faz a alma borbulhar, de um lugar que não se sabe onde é, mas que existe, é claro que existe. Esta possibilidade de se experimentar a dor, quando a dor chega, com a mesma verdade com que se experimenta a alegria. Esta incapacidade de não se admirar com o encanto grandioso que também mora na subtileza. Esta vontade de espalhar buquês de sorrisos por aí, porque os sensíveis, por mais que chorem de vez em quando, não deixam adormecer a ideia de um mundo que possa acordar sorrindo. Para toda gente. Para todo ser. Para toda vida.
Eu até já tentei ser diferente, por medo de doer, mas não tem jeito: só consigo ser igual a mim.
[Ana Jácomo]
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