terça-feira, 28 de abril de 2015

Que nunca te falte...

Ilustr.: Katie m. Berggren





Que nunca te falte:
A estrada que te leva e a força que te levanta
O amor que te humaniza e a razão que te equilibra
O pão de todo dia e o verso de cada poema.

[Lou Wit]

segunda-feira, 27 de abril de 2015

Eterno

Ilustr.: BEELD.MOTION

O que significa eterno?
Eterno, é tudo aquilo que dura uma fração de segundo, mas com tamanha intensidade, que se petrifica, e nenhuma força jamais o resgata...
Um dia descobrimos que beijar uma pessoa para esquecer outra, é bobagem.Você não só não esquece a outra pessoa como pensa muito mais nela...
Um dia descobrimos que se apaixonar é inevitável...
Um dia percebemos que as melhores provas de amor são as mais simples...
Um dia percebemos que o comum não nos atrai...
Um dia saberemos que ser classificado como o "bonzinho" não é bom...
Um dia perceberemos que a pessoa que nunca te liga é a que mais pensa em você...
Um dia percebemos que somos muito importante para alguém, mas não damos valor a isso...
Um dia percebemos como aquele amigo faz falta, mas ai já é tarde demais...
Enfim...
Um dia descobrimos que apesar de viver quase um século esse tempo todo não é suficiente para realizarmos todos os nossos sonhos, para dizer tudo o que tem que ser dito...
O jeito é: ou nos conformamos com a falta de algumas coisas na nossa vida ou lutar para realizar todas as nossas loucuras...
Quem não compreende um olhar tampouco compreenderá uma longa explicação.

[Mário Quintana]

domingo, 26 de abril de 2015

Adeus

Ilustr.: Duy Huynh
Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mão à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras
e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro!
Era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.

Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes!
e eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.
Mas isso era no tempo dos segredos,
no tempo em que o teu corpo era um aquário,
no tempo em que os meus olhos
eram peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco, mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.

Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor...,
já se não passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.
Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.

Adeus.

[Eugénio de Andrade]

segunda-feira, 20 de abril de 2015

Mais nada a fazer

Ilustr.: Brita Seifert (1963)
Quando fazemos tudo para que nos amem e não conseguimos, resta-nos um último recurso: não fazer mais nada.
Por isso, digo, quando não obtivermos o amor, o afeto ou a ternura que havíamos solicitado, melhor será desistirmos e procurar mais adiante os sentimentos que nos negaram. Não fazer esforços inúteis, pois o amor nasce, ou não, espontaneamente, mas nunca por força de imposição. Às vezes, é inútil esforçar-se demais, nada se consegue; outras vezes, nada damos e o amor se rende aos nossos pés.
Os sentimentos são sempre uma surpresa. Nunca foram uma caridade mendigada, uma compaixão ou um favor concedido.
Quase sempre amamos a quem nos ama mal, e desprezamos quem melhor nos quer.
Assim, repito, quando tivermos feito tudo para conseguir um amor, e falhado, resta-nos um só caminho… o de mais nada fazer.

[Clarice Lispector]

sexta-feira, 17 de abril de 2015

Ideias metafísicas

Ilustr.: Georgy Kurasov
A única realidade para mim são as minhas sensações. Eu sou uma sensação minha. Portanto nem da minha própria existência estou certo. Posso está-lo apenas daquelas sensações a que eu chamo minhas.

A verdade? — É uma coisa exterior? Não posso ter a certeza dela, porque não é uma sensação minha, e eu só destas tenho a certeza. Uma sensação minha? De quê?

Procurar o sonho é pois procurar a verdade, visto que a única verdade para mim sou eu próprio. Isolar-me tanto quanto possível dos outros é respeitar a verdade.

Toda a metafísica é a procura da verdade, entendendo por Verdade a verdade absoluta. Ora a Verdade, seja ela o que for, e admitindo que seja qualquer coisa, se existe existe ou dentro das minhas sensações, ou fora delas ou tanto dentro como fora delas. Se existe fora das minhas sensações, é uma coisa de que eu nunca posso estar certo, não existe para mim portanto; é, para mim, não só o contrário da Certeza, porque só das minhas sensações estou certo, mas o contrário de ser, porque a única coisa que existe para mim são as minhas sensações. De modo que, a existir fora das minhas sensações, a Verdade é para mim igual à Incerteza e não-ser — não existe e não é a verdade, portanto. Mas concedamos o absurdo de que as minhas sensações possam ser o erro, e o não-ser (o que é absurdo, visto que elas, com certeza, existem) — nesse caso a verdade é o ser e existe fora das minhas sensações totalmente. Mas a ideia Verdade é uma ideia minha; existe, por isso, dentro das minhas sensações: portanto, no que Verdade abstracta e fora de mim, a verdade existe dentro de mim — contradição, portanto; e erro, consequentemente.

A outra hipótese é que a verdade exista dentro das minhas sensações. Nesse caso ou é a soma delas todas, ou é uma delas, ou parte delas. Se é uma delas, em que se distingue das outras? Se é uma sensação, não se distingue essencialmente das outras; e, para que se distinguisse, era preciso que se distinguisse essencialmente. E se não é uma sensação, não é uma sensação.

Se é parte das minhas sensações, que parte? As sensações têm duas faces — a de serem sentidas e a de serem dadas como coisas sentidas, a parte pela qual são minhas e a parte pela qual são de «coisas». É uma destas partes, que a verdade, a ser parte das minhas sensações, tem de ser. (Se é de qualquer modo um grupo de sensações unificando-se a constituir uma só sensação, cai sob a garra do raciocínio que liquida a hipótese anterior.)

Se é uma das duas faces — qual? A face «subjectiva»? Ora essa face subjectiva aparece-me sob uma de duas formas — ou a da minha «individualidade» una ou [a] de uma múltipla individualidade «minha». No primeiro caso é uma sensação minha como qualquer outra e já fica refutada no argumento anterior. No segundo caso, essa verdade é múltipla e diversa, é verdades — o que é contraditório com a ideia de Verdade, valha ela o que valer.

Será então a face objectiva? — O mesmo argumento se aplica, porque ou é uma unificação dessas sensações numa ideia de um mundo exterior — e essa ideia ou não é nada ou é uma sensação minha, e se é uma sensação, já fica refutada essa hipótese; ou é de um múltiplo mundo exterior, e isso reduz-se à mesma contradição entre pluralidade de verdades e a essência da ideia de Verdade.

Resta analisar se a Verdade é o conjunto das nossas sensações. Essas sensações ou são tomadas como uma ou como muitas. No primeiro caso voltamos à já rejeitada hipótese. No segundo caso a Verdade como ideia desaparece, porque se consubstancia com a totalidade das nossas sensações. Mas para ser a totalidade das nossas sensações, mesmo concebidas como nossas sensações, nuamente, a verdade fica dispersa — desaparece. Porque, ou se baseia na ideia de totalidade, que é uma ideia (ou sensação) nossa, ou não se apoia em parte nenhuma. Mas nada prova, mesmo, a identidade de verdade e totalidade. Portanto, a verdade não existe.

Mas nós temos a ideia...

Temos, mas vemos que não corresponde a «Realidade» nenhuma, suposto que Realidade significa qualquer coisa. A Verdade é portanto uma ideia ou sensação nossa, não sabemos de quê, sem significação, propósito ou valor, como qualquer outra sensação nossa.

Ficamos portanto com as nossas sensações por única «realidade», entendendo que «realidade» não tem aqui sentido nenhum, mas é uma conveniência para frasear. De «real» temos apenas as nossas sensações, mas «real» (que é uma sensação nossa) não significa nada, nem mesmo «significa» significa qualquer coisa, nem «sensação» tem um sentido, nem «tem um sentido» é coisa que tenha sentido algum. Tudo é o mesmo mistério... Reparemos porém em que nem tudo quer dizer coisa alguma, nem «mistério» é palavra que tenha significação.

[Fernando Pessoa, in 'Ideias metafísicas do Livro do Desassossego']

terça-feira, 14 de abril de 2015

Somos porque ganhamos

Ilustr.: Anil Tortop





Somos porque ganhamos.
Se perdemos, deixamos de ser.

[Eduardo Galeano]

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Medo global

Ilustr.: Valeria Docampo
Os que trabalham têm medo de perder o trabalho, os que não trabalham têm medo de nunca encontrar o trabalho.
Quem não tem medo da fome tem medo da comida.
Os automobilistas têm medo de caminhar e os pedestres têm medo de ser atropelados.
A democracia tem medo de recordar e a linguagem tem medo de dizer.
Os civis têm medo dos militares e os militares têm medo da falta de armas.
As armas têm medo da falta de guerras.
Medo da mulher à violência do homem, medo do homem das mulheres sem medo.
Medo dos ladrões, medo da polícia.
Medo da porta sem fechadura, do tempo sem relógio, das crianças sem televisão.
Medo da noite sem comprimidos para dormir, medo de dia sem comprimidos para acordar.
Medo da multidão, medo da solidão.
Medo do que foi e do que pode ser.
Medo de morrer, medo de viver.

[Eduardo Galeano]

quarta-feira, 8 de abril de 2015

Sentidos

Ilustr.: Chanelle Kotze




De todos os sentidos, a vista é o mais superficial.
O ouvido, o mais orgulhoso.
O olfato, o mais voluptuoso.
O gosto, o mais inconstante.
E o tato, o mais profundo.

[Diderot]

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Paraíso


E nós, na verdade, com justiça, porque recebemos o que os nossos feitos mereciam; mas este nenhum mal fez.
E disse a Jesus:
Senhor lembra-te de mim, quando entrares no teu reino.
E disse-lhe Jesus:
Em verdade te digo que hoje estarás comigo no paraíso.

[Lucas 23:43]

quarta-feira, 1 de abril de 2015

Mentiras

Ilustr.: Georgy Kurasov




Há três espécies de mentiras:
as mentiras,
as mentiras sagradas
e as estatísticas.

[Mark Twain]