sexta-feira, 2 de outubro de 2015

Alusão a mim

Ilustr.: Albin Veselka
Tenho uma alma muito prolixa e uso poucas palavras; sou irritável e piro facilmente; também sou muito calma e perdoo logo; não esqueço nunca; mas há poucas coisas de que eu me lembre; sou paciente, mas profundamente colérica, como a maioria dos pacientes; as pessoas nunca me irritam mesmo, certamente porque eu as perdoo de antemão; gosto muito das pessoas por egoísmo: é que elas se parecem no fundo comigo; nunca esqueço uma ofensa, o que é uma verdade, mas como pode ser verdade, se as ofensas saem de minha cabeça como se nunca nela tivessem entrando?
Tenho uma paz profunda, somente porque ela é profunda e não pode ser sequer atingida por mim mesmo; se fosse alcançável por mim, eu não teria um minuto de paz; quanto a minha paz superficial, ela é uma alusão à verdadeira paz; outra coisa que esqueci é que há outra alusão em mim - a do mundo grande e aberto; apesar do meu ar duro, sou cheia de muito amor e é isso o que certamente me dá uma grandeza.

[Clarice Lispector]

quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Ler devia ser proibido

Ilustr.: ...


Ler devia ser proibido...
Afinal de contas, ler faz muito mal às pessoas:
acorda os homens para realidades impossíveis,
tornando-os incapazes de suportar o mundo insosso e vulgar em que vivem.
Ler pode tornar o homem perigosamente humano.

[Guiomar de Grammont]