sábado, 31 de maio de 2014

Cansaço

Ilustr.: Tomasz Rut




Porque metade de mim é abrigo,
a outra metade é cansaço.

[Oswaldo Montenegro]

sexta-feira, 30 de maio de 2014

Pelas tuas mãos

Ilustr.: Sandra Bierman


Plante o seu jardim e decore a sua alma
ao invés de esperar que alguém lhe traga flores.

[William Shakespeare]



quinta-feira, 29 de maio de 2014

Confiar, amar e viver

Ilustr.: Vero Navarro




Acreditar não é confiar,
Amar não é suportar,
Contentar-se não é viver.

[Antonello De Sanctis]

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Golias

Ilustr.: Monster & Co / Pixar

O primeiro pensamento da manhã,
a última preocupação da noite.
O seu Golias domina o seu dia e se infiltra na sua alegria.

[Max Lucado]

terça-feira, 27 de maio de 2014

Vontade universal

Ilustr.: Marie Cardouat



O bom proceder consiste em sermos em tudo sinceros e
conformarmos a alma com a vontade universal, isto é,
fazer aos outros aquilo que desejamos que nos façam.

[Confúcio]

segunda-feira, 26 de maio de 2014

A última pincelada

Ilustr.: Alberto Pancorbo

Viveu em tempos um pintor que nunca conseguia acabar de pintar uma ave, fosse ela uma cegonha ou uma garça.
Quando se preparava para dar a última pincelada, ela levantava vôo.
E o pintor ficava muito tempo ainda a persegui-la com o pincel no céu azul.

[Jorge de Sousa Braga]

domingo, 25 de maio de 2014

Não o sonho!

Ilustr.: Guilherme de Santa-Rita


A vocês, eu deixo o sono.
O sonho, não!
Este eu mesmo carrego!

[Paulo Leminski]

sábado, 24 de maio de 2014

Em vez disso

Ilustr.: Virginia Palomeque





Esqueça essa vontade de querer entender tudo.
Em vez disso, viva!
Em vez disso, divirta-se!
Não analise, celebre.

[Osho]

sexta-feira, 23 de maio de 2014

Tentaram

Ilustr.: Alberto Pancorbo

Tentaram me fazer acreditar que o amor não existe e que sonhos estão fora de moda. Cavaram um buraco bem fundo e tentaram enterrar todos os meus desejos, um a um, como fizeram com os deles.
Mas como mulher-teimosa que sou, ainda insisto em desentortar os caminhos. Em construir castelos sem pensar nos ventos. Em buscar verdades enquanto elas tentam fugir de mim. A manter o meu buquê de sorrisos no rosto, sem perder a vontade de antes.
Porque aprendi, que a vida, apesar de bruta, é meio mágica. Dá sempre para tirar um coelho da cartola. E lá vou eu, nas minhas tentativas, às vezes meio cegas, às vezes meio burras, tentar acertar os passos. Sem me preocupar se a próxima etapa será o tombo ou o voo. Eu sei que vou.
Insisto na caminhada. O que não dá é para ficar parado. Se amanhã o que eu sonhei não for bem aquilo, eu tiro um arco-íris da cartola. E refaço. Colo. Pinto e bordo. Porque a força de dentro é maior. Maior que todo mal que existe no mundo. Maior que todos os ventos contrários. É maior porque é do bem. E nisso, sim, acredito até o fim. O destino da felicidade me foi traçado no berço.

[Caio Fernando Abreu]

quinta-feira, 22 de maio de 2014

Retrato de Amigo

Ilustr.: Patrice Murciano

Por ti falo. E ninguém sabe. Mas eu digo
meu irmão, minha amêndoa, meu amigo
meu tropel de ternura, minha casa
meu jardim de carência, minha asa.

Por ti morro e ninguém pensa. Mas eu sigo
um caminho de nardos empestados
uma intensa e terrífica ternura
rodeado de cardos por muitíssimos lados.

Meu perfume de tudo, minha essência
meu lume, minha lava, meu labéu
como é possível não chegar ao cume
de tão lavado céu?

[Ary dos Santos, in 'Fotosgrafias']

quarta-feira, 21 de maio de 2014

Jardim dos Mortos

Ilustr.: Roberto Ferri
Fui pedir um sonho ao jardim dos mortos.
Quis pedi-lo, aos vivos. Disseram-me que não.
Os mortos não sabem, lá onde é que estão,
Que neles se enfeitam os meus braços tortos.

Os mortos dormiam... Passei-lhes ao lado.
Arranquei-lhes tudo, tudo quanto pude;
Páginas intactas — um livro fechado
Em cada ataúde.

Ai as pedras raras! As pedras preciosas!
Relâmpagos verdes por baixo do mar!
A sombra, o perfume dos cravos, das rosas
Que os dedos, já hirtos, teimavam guardar!

Minha alma é um cadáver pálido, desfeito.
As suas ossadas
Quem sabe onde estão?
Trago as mãos cruzadas,
Pesam-me no peito.
Quem sabe se a lama onde hoje me deito
Dará flor aos vivos que dizem que não?

[Pedro Homem de Mello, in "Príncipe Perfeito"]

terça-feira, 20 de maio de 2014

Esconderijo

Ilustr.: Denis Nunez Rodriguez
Felicidade,
não é um sorriso no rosto.
Ontem chorei.
Chorei de feliz...
Tristeza,
não é uma lágrima no rosto.
Hoje sorri.
Sorri, mas estou triste...

Ninguém percebe isso,
quando fazemos da lágrima ou do sorriso, um esconderijo.

[Laura Méllo]

segunda-feira, 19 de maio de 2014

A Nossa Casa

Ilustr.: Evgeni Gordiets
A nossa casa, Amor, a nossa casa! 
Onde está ela, Amor, que não a vejo? 
Na minha doida fantasia em brasa 
Constrói-a, num instante, o meu desejo! 

Onde está ela, Amor, a nossa casa, 
O bem que neste mundo mais invejo? 
O brando ninho aonde o nosso beijo 
Será mais puro e doce que uma asa? 

Sonho... que eu e tu, dois pobrezinhos, 
Andamos de mãos dadas, nos caminhos 
Duma terra de rosas, num jardim, 

Num país de ilusão que nunca vi... 
E que eu moro - tão bom! - dentro de ti 
E tu, ó meu Amor, dentro de mim... 

[Florbela Espanca, in "Charneca em Flor"]

domingo, 18 de maio de 2014

Sensitivo



É na escura folhagem do sono que brilha a pele molhada,
a difícil floração da língua.

[Eugénio de Andrade]

sábado, 17 de maio de 2014

Екатерина Великая

Ilustr.: Suzanne Marie Leclair



Que sal é este em meus olhos marejados?
São lágrimas inesperadas da alegria que me invade
de te ver chegar aqui!

[Luís Gonzaga]

sexta-feira, 16 de maio de 2014

O que não abraço

Ilustr.: Ironland



Só me pertence o que não abraço.
Eis como eterno me condeno:
Amo o que não tem despedida.

[Mia Couto]

quinta-feira, 15 de maio de 2014

Compreensão

Ilustr.: Rébecca Dautremer




Não se discute para ter a razão,
mas para poder compreender.

[Jorge Luis Borges]

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Aquém Natal...

Ilustr.: Heidi Taillefer

No ventre de uma mulher grávida estão dois bebés.
Pergunta um ao outro:
- Tu acreditas na vida depois do parto?
- Claro que sim. Deve existir alguma coisa depois do parto. Talvez estejamos aqui porque precisamos de nos preparar para o que seremos mais tarde.
- Maluquices! Não há vida depois do parto. Como seria essa vida?
- Não sei, mas de certeza que… deve haver mais luz do que aqui. Talvez caminhemos pelos nossos pés e nos alimentemos pela boca…
- Isso é absurdo! É impossível caminhar. E, comer pela boca? Isso é ridículo! O cordão umbilical é a única forma de nos alimentarmos. E digo-te mais: a vida depois do parto não existe… O cordão umbilical é demasiado curto…
- Pois, eu acredito que deve haver mais alguma coisa. Deve ser apenas um pouco diferente daquilo a que estamos agora habituados.
- Mas ninguém voltou do além, do pós-parto. O parto é o final da vida. E no fim de contas, a vida não é mais do que uma angustiosa existência na escuridão que não leva a nada.
- Bom,… eu não sei exactamente como será depois do parto, mas de certeza que veremos a nossa mamã e ela cuidará de nós.
- Mamã? Tu acreditas na mamã? Onde é que ela está?
-Onde? À nossa volta. É nela e através dela que vivemos. Sem ela não existiríamos.
- Pois, eu não acredito! Nunca viste a mamã, … por isso, é lógico que ela não existe.
- Mas, … às vezes, no silêncio, podes ouvi-la a cantar ou senti-la quando acaricia o nosso mundo. Sabes…? Penso que deve haver uma vida real que está à nossa espera, e que agora estamos apenas a preparar-mo-nos para ela…

[in “Año de la Fé”]

terça-feira, 13 de maio de 2014

Minha razão de vida

Ilustr.: Ricardo Celma
Minha filha, meu poema 
Meu doce tema... d'inspiração 
Amor por mim inventado 
Musa dum fado... feito paixão... 
Meu pedacinho de vida 
Com olhos lindos... da côr do céu 
Minha roseira florida 
Prémio que a vida... me ofereceu 

Minha filha, minha amada 
Minha alvorada... de encantamento 
Meu respirar de alegria 
Meu novo dia... meu novo alento... 
Tens no rosto tal beleza 
Que à natureza... fazes ciúme 
Tens perfil de terna flor 
E o teu amor... é meu perfume 

Meu quadro d'amor sublime 
Por ti se exprime... meu coração 
Meu sonho realizado 
Fado cantado... com devoção... 
Meu sol de cada manhã 
Meu talismã... minha verdade 
Poema mais que desperto 
Caminho aberto... p'rá felicidade 

[José Fernandes Castro]

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Viagem

Ilustr.: Angela Felipe, Travessia


A viagem não começa quando se percorrem distâncias,
mas quando se atravessam as nossas fronteiras interiores.

[Mia Couto, in 'O outro pé da Sereia']



domingo, 11 de maio de 2014

Tango

Ilustr.: Kathryn Renee



Os nossos corpos têm a mesma batida,
o mesmo ritmo,
o mesmo tango por dentro.

[Manuel Alegre]

sábado, 10 de maio de 2014

Começo a conhecer-me

Ilustr.: Paul Knight

Começo a conhecer-me. Não existo.
Sou o intervalo entre o que desejo ser e os outros me fizeram,
ou metade desse intervalo, porque também há vida ...
Sou isso, enfim ...
Apague a luz, feche a porta e deixe de ter barulhos de chinelos no corredor.
Fique eu no quarto só com o grande sossego de mim mesmo.
É um universo barato.

[Álvaro de Campos, in "Poemas"]

sexta-feira, 9 de maio de 2014

A princípio não te vi




Tu eras também uma pequena folha que tremia no meu peito. O vento da vida pôs-te ali.
A princípio não te vi: não soube que ias comigo, até que as tuas raízes atravessaram o meu peito, se uniram aos fios do meu sangue, falaram pela minha boca, floresceram comigo.

[Pablo Neruda]

quinta-feira, 8 de maio de 2014

Esse mar...

Ilustr.: Lucelle Raad
... se eu lhe disser que o mar começa
você dirá que ele cessa
se eu lhe disser que ele avança
você dirá que ele cansa
se eu lhe disser que ele fala
você dirá que ele cala
e tudo será o mar e nada será o mar
o mar mesmo aberto atrás da popa como uma fruta roxa
uma vulva frouxa no seu mel de orgasmo
no seu mal de espasmo
o mar gárgulo e gargáreo gorjeando gárrulo
esse mar esse mar livro esse livro mar marcado e vário murchado e flóreo multitudinoso mar
purpúreo marúleo mar azúleo
e mas e pois e depois e agora e se e embora e quando e outrora e mais e ademais
mareando marujando marlunando marlevando marsoando...

[Haroldo de Campos in 'Galaxias']

quarta-feira, 7 de maio de 2014

Desafio

Ilustr. in http://sphotos-c.ak.fbcdn.net/


Deixe que os outros tenham vidas insignificantes, mas não você.
Deixe que os outros discutam sobre pequenas coisas, mas não você.
Deixe que os outros chorem por pequenas dores, mas não você.
Deixe que outros abandonem o seu futuro nas mãos de alguém, mas não você!

[Jim Rohn]

terça-feira, 6 de maio de 2014

Paralelas

Ilustr.: KDrew - Last Train To Paradise
Duas linhas paralelas
muito paralelamente
iam passando entre estrelas
fazendo o que estava escrito:
caminhando eternamente
de infinito a infinito.

Seguiam-se passo a passo
exactas e sempre a par
pois só num ponto do espaço
que ninguém sabe onde é 
se podiam encontrar
falar e tomar café.

Mas farta de andar sozinha
uma delas certo dia
voltou-se para a outra linha
sorriu-lhe e disse-lhe assim:
«Deixa lá a geometria
e anda aqui para o pé de mim...»

Diz a outra: « Nem pensar!
Mas que falta de respeito!
se quisermos lá chegar 
temos de ir devagarinho
andando sempre a direito
cada qual no seu caminho!»

Não se dando por achada
fica na sua a primeira
e sorrindo amalandrada
pela calada, sem um grito
deita a mãozinha matreira
puxa para si o infinito.

E com ele ali à frente
as duas a murmurar
olharam-se docemente
e sem fazerem perguntas
puseram-se a namorar
seguiram as duas juntas.

Assim nestas poucas linhas
fica uma estória banal
com linhas e entrelinhas,
e uma moral convergente:
o infinito afinal
fica aqui ao pé da gente.

[José Fanha]

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Superação

Ilustr.: Donald Zolan



Problemas não são obstáculos,
mas oportunidades ímpares de superação e evolução.

[Maurício Rodrigues de Morais]

domingo, 4 de maio de 2014

Abrigo

Ilustr.: Ricardo Celma
Mãe — que adormente este viver dorido,
E me vele esta noite de tal frio,
E com as mãos piedosas ate o fio
Do meu pobre existir, meio partido...

Que me leve consigo, adormecido,
Ao passar pelo sítio mais sombrio...
Me banhe e lave a alma lá no rio
Da clara luz do seu olhar querido...

Eu dava o meu orgulho de homem — dava
Minha estéril ciência, sem receio,
E em débil criancinha me tornava.

Descuidada, feliz, dócil também,
Se eu pudesse dormir sobre o teu seio,
Se tu fosses, querida, a minha mãe!

[Antero de Quental, in "Sonetos"]

sábado, 3 de maio de 2014

Eu sou Salomão!






Os outros vêem-me como sou,
ou sou como me vêem os outros?
O difícil não é saber como me vêem os outros.
Posso lê-lo nos seus olhares.
O difícil é descobrir quem sou eu.

[Flusser]

sexta-feira, 2 de maio de 2014

Erros humanos

Ilustr.: Danilo Ricciardi






Todos os erros humanos são impaciência,
uma interrupção prematura de um trabalho metódico.

[Franz Kafka]

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Fazer as Pazes

Ilustr.: Lucelle Raad
Para fazer as pazes é preciso haver uma guerra.
Mas, quando não há uma guerra ou só a suspeita, ou ciúme, de haver uma ameaça, ou uma desatenção, de a paz que encanta e apaixona, se tornar num hábito, as pazes ficam feitas e celebra-se essa felicidade.
O conflito e a diferença de personalidades - a identidade pessoal de cada um e quanto estamos dispostos a sacrificarmo-nos por defendê-la - são grossamente exagerados.
É a necessidade de se achar que se é diferente - nos afectos, nas necessidades - que provoca todos os mal-entendidos e a maior parte das infelicidades.
Muito ganharíamos - se perdêssemos só o que temos de perder e amargar -, se partíssemos do princípio que somos todos iguais, homens e mulheres, eu e tu, eles e nós. E que é o pouco que nos diferencia e distancia, por muito caro que nos saia, que consegue o milagre de tornarmo-nos mais atraentes uns aos outros.
As guerras imaginadas são mil vezes melhores do que as verdadeiras.
A ilusão da diferença (de personalidades, sexos, sexualidades, culturas - e tudo o mais que arranjamos para chegar à ficção vaidosa que cada um é como é) passou a ser o que apreciamos ser a nossa nociva e dispensável individualidade.
A melhor maneira - a única - de fazer as pazes é reconhecer que não houve guerra.
Vale apenas o pressentimento humilde e paranóico de um vago desejo, da parte das duas partes amadas, de exprimirem hostilidades, por muito indesejadas e inexistentes. Que nem isso foram.

[Miguel Esteves Cardoso, in 'Jornal Público, 1 Jul 2011']